15 fevereiro, 2006

Tolerância vs intolerância

Ainda os cartoons de Maomé.
Fiquei pasmo ao ler os comentários às notícias veiculadas por um certo matutino de que recebo a newsletter, o qual, não sendo exactamente um jornal de referência, é ainda assim um espelho do pensamento de boa parte da população portuguesa.
Pois muitos dos nossos concidadãos entendem que o Ocidente se está a pôr de cócoras perante o Islão ao condenar como excesso libertário a publicação dos ditos cartoons. Que não tem nada que pedir desculpa, que os muçulmanos só têm é que engolir tudo o que lhes é posto à frente, porque são uns atrasados, retrógrados e fanáticos que não merecem qualquer consideração e muito menos uma condenação formal das caricaturas por parte do MNE e do Governo, opinião que, de resto, é partilhada por vários jornalistas.
Em adição a isto, numa sondagem on-line efectuada pelo mesmo jornal, mais de 90% dos participantes manifestou-se a favor de uma intervenção armada dos EUA no Irão, como forma de resolver a questão da capacidade nuclear deste último.
Importa aqui colocar algumas questões.
Se o caricaturado fosse Jesus Cristo ou o Papa em vez de Maomé, qual seria a reacção em Portugal? Seria igualzinha à dos muçulmanos, exceptuando talvez os ânimos exacerbados. E isto não por o país ser mais "civilizado", mas por, apesar de tudo, a sua população ter uma vida melhor em comparação com as dos países árabes (há que lembrar que em muitos destes países as populações não dispõem de saneamento básico, por exemplo). Não acreditam? Aqui vai um exemplo: lembram-se quando um caricaturista português teve a ideia de desenhar o Papa João Paulo II com um preservativo enfiado no nariz, para ilustrar a intransigência da Igreja ao proibir o uso de métodos contraceptivos? Estão igualmente recordados da reacção hostil que então se verificou?
Por outro lado, este apoio expresso a uma intervenção armada é, no mínimo, contraditório. É que parte das mesmas pessoas que, após a morte daquele soldado português no Afeganistão, exigiram o retormo imediato das nossas tropas estacionadas no estrangeiro. Estarão acaso à espera que sejam outros a efectuar as despesas em vidas humanas que tal operação, justificada ou não, acarreta? Ou será que uma guerra é boa quando é o vizinho a morrer e deixa de o ser quando a grande igualadora vira a sua atenção para nós? E depois do Irão, quem se seguirá? Talvez a Coreia do Norte ou a Palestina ou um outro qualquer e assim por diante, até que finalmente haja paz... a paz dos cemitérios.
A tolerância tem de ser mais que uma simples palavra. Tem de ser uma atitude, uma filosofia de vida. Porque se não respeitarmos os outros como poderemos exigir respeito da parte deles? A violência só gera mais violência. Como disse o Mahatma Gandhi: "Nesta política do olho por olho, acabaremos todos cegos."

2 comentários:

O Pai disse...

Fernão, meu caro, temos que nos assumir. Eu sou europeu, cristão por educação, mas não tenho culpa nenhuma disso! Se eu acho que podemos e devemos fazer caricaturas do que quer que seja, eu opino favoravelmente. Bem sei que se fosse muçulmano poderia estar indignado, mas não sou. Não apoio guerra nenhuma a lado nenhum, mas sei que muitos dos nossos avós morreram a lutar para que nós pudessemos fazer caricaturas sem medo de sofrermos represálias. E não estou a falar da "outra senhora", estou a falar da história TODA. No contra-informação fazem-se/dizem-se coisas piores...mas com eles, os muçulmanos, não, não se pode brincar...arre!
Eu ralado que eles falem do holocausto...e de um concurso sobre o holocausto..eu acho bem, até sou homem para concorrer...haja bom-humor e bom-senso...
São opiniões...

Olindo Iglesias disse...

Eu vi as caricaturas pela primeira vez, penso que, em Outubro. Na altura achei a provocação desnecessária.

Ainda assim estou com os restantes portugues. Acho que a Europa se pôs de cócoras. Não é admíssivel, nem podemos aceitar ver as nossas Embaixadas ser destruídas sem tomarmos uma posição de força.

Enfim... fomos uns cobardes.

Nota: Eu moro na Arábia Saudita, e trabalho sobretudo com árabes, e não vi neste país nem nas pessoas a hostilidade que se via na TV. Por isso acredito que há/houve algures uma agenda política escondida que utilizou/vai utilizar este assunto para qualquer fim menos sério.