17 maio, 2005

História e Religião



Nos últimos meses, surgiram-me várias questões na cabeça, pelo que começarei a minha primeira intervenção neste espaço com aquela que mais polémica tem levantado, um pouco por todo o mundo, nomeadamente desde o lançamento do romance de Dan Brown, “O Código Da Vinci”.
Partirei do principio que estamos todos, mais ou menos, inteirados do assunto que o mesmo trata e, como tal, do que originou, tanto na comunidade cientifica como na comunidade religiosa. Assim sendo, também terá reflexos na comunidade a que nós, formados em História, pertencemos!
Excusando-me a fazer um resumo ou mesmo uma critica ao romance que, aliás, li com algum interesse, as questões que ali se tratam parecem ter afectado muita gente, pessoas talvez mais importantes do que possamos ter ideia. O seu autor, diz-se, teve acesso, durante anos, aos arquivos ditos secretos do Vaticano, o que terá deixado a sensação de que sabia do que falava quando escrevia acerca do Santo Graal, de Jesus Cristo e de Madalena. Longe de se saber a veracidade de tal facto, o certo é que passou a ideia de que o que originou( desde guias especializados em desmentir o autor, a outros romances que confirmam muitas das suas ideias ), é o resultado de algo maior do que apenas contestação ou aceitação.
Dan Brown, no fundo, parece estar a mexer com dois mil anos de História, Fé e Crença, o que mexe também com os sentimentos e as certezas de uma civilização que, como os meus avós e pais, cresceu com a presença de Deus, Jesus, a Crucificação, a Última Ceia, a Ressurreição.
Como explicar a esta civilização que, como afirma o autor, Madalena foi esposa de Jesus, fazendo dele um homem comum? Uma só questão que, para quem leu o romance e está a par das discussões posteriores, tendem a levantar muitas mais.
No entanto, não é para falar de “O Código Da Vinci” que escrevo. As questões que ali se levantam e que na minha cabeça originaram muitas mais, são, aqui, muito mais importantes. Aconteceu, por acaso, ter acesso a um texto de um autor de seu nome La Sagesse, que leva o assunto muito mais longe, causando-me uma grande estranheza ou mesmo uma grande estupefacção: segundo este autor, Jesus Cristo, a Religião Cristã, as crenças e tudo o que foi construído durante dois mil anos e tido como verdadeiro, não passou disso mesmo, uma construção! Se o romance já me havia deixado confuso, este texto que agora refiro deixou-me ainda mais! Questionar é uma coisa, afirmar é outra completamente diferente.
La Sagesse, entre outras coisas, afirma que Jesus não existiu, é uma espécie de mito, criado para o benefício de alguns. Que a Bíblia é uma compilação de coisas falsas, de estórias posteriores a Cristo e que foi adulterada ao longo de anos, com o único objectivo de fazer “calar” os escritos de contemporâneos de Jesus Cristo que, aliás, nem sequer mencionam o seu nome nem nenhum dos seus actos.
Levantam-se assim outras questões que nos deixam a pensar. La Sagesse questiona a figura de Deus como sendo o Criador, ser omnipresente e omnisciente, quando a ciência nos deu provas que o nosso planeta é uma infima particula de um extenso universo. Há ainda quem faça a pergunta: que legitimidade terá um Deus único, omnipresente e Criador perante a enorme quantidade de deuses egipcios, gregos e romanos?
Não querendo, de todo, lançar qualquer tipo de polémica, a intenção aqui é procurar, com o debate, esclarecer mais do que as minhas dúvidas, as dúvidas de alguns colegas, porque as deve haver.

6 comentários:

O Pai disse...

Pois, bem visto e com oportunidade. O filme Cruzadas e a recente eleição do Papa obrigam-nos a rever todas estas questões. Mas afinal qual é o papel da História, enquanto ciência, perante todos estes complexos problemas? " Não misturem as coisas" - alguém dirá. "Fé é uma coisa, Ciência é outra". Tudo bem, responderei, mas eu quero é saber dos factos. Se não deveremos questionar Deus, se acreditarmos que não é matéria, o que é só por si estranho, já com Cristo podemos e devemos fazê-lo. Filon, um judeu de valor inquestionável,"contemporâneo" de Cristo, ao qual não iriam escapar ao menos os seus milagres, nada diz sobre aquele profeta. Alguém me refira um documento não-falsificado que prove a existência de Jesus Cristo. O 5º Evangelho?Meus amigos, longe de querer fazer uma Cruzada contra o cristianismo, paradoxo dos paradoxos(!!), direi que daqui a uns milhares de anos, se a terra não for entretanto destruída pelo homem, se dirá, numa qualquer Enciclopédia que "o Cristianismo foi uma religião monoteísta que, a exemplo do islamismo, dominou a vida dos seus seguidores por largos séculos, atrávés de uma activa participação na cena política. Os papas, os líderes máximos do cristianismo, combateram de forma impiedosa ( ver Cruzadas, Inquisição)todos os seus oponentes, numa cega e trágica luta por uma "verdade" que era só sua, a da Igreja Católica".
Não poderemos reduzir a questão ao que de mau foi feito, mas o que é certo é que aos olhos de um cientista social, de um historiador, de um estudante de História, um Jesus Cristo e seus apótolos fantasmas, de evidências históricas inexistentes, como levar a sério uma religião assente nestas bases? E reparem, não estou a ser nada duro, estou apenas a questionar e a pedir provas. Se elas existirem, revejo a minha posição, claro. Sabe-se que o Cristianismo resultou de um sincretismo, de uma imitação, de um apanhado, de muitas outras crenças religiosas, o que lhe poderá tirar alguma credibilidade na sua formação e desenvolvimento.
Mas quem sou eu para por em causa tantos milhões e pessoas, muito mais inteligentes do que eu? Se calhar sou um lunático perdido, em busca de alguns minutos de glória, qual descobridor de pólvora húmida.

bombas disse...

Baseado em fonte-mais-que-segura, que não fala sem reflectir, que lê mais livros numa manhã do que eu na minha vida toda, que tem acesso a pessoas de topo, inclusivé o maior Historiador de Teologia Português, sensato, responsavel e coerente como ninguém, venho aqui dizer que, segundo ele, existem apenas 12 linhas escritas, pelos Romanos da Galileia para a grande Roma, onde se refere a existência de Cristo. Deve ser a única "prova" para um Historiador.
Quanto à sua existência, não tenho qquer dúvida. Quanto ao seu legado,...????? casado, enganador, mágico para os inocentes, terá borrado as cuecas todas e chorado ou pedido clemência quando supostamente foi cruxificado?
Porque será que o povo venera tanto os "Santinhos"?
Porquê a devoção ao Padre Cruz ou
ou à Madre Teresa de Calcutá?? São palpáveis? Intermediários de Cristo e por sua vez de Deus??
Será que a dúvida só atinge o Historiador, ou inconscientemente as pessoas têm tendência a tornear os obstáculos causados pelo medo da morte, tendo essas também muitas dúvidas?
è claro que só sei que nada sei.
E quanto mais penso, pior fico.
Mas que a Igreja Apostólica Romana cometeu, ao longo de 2.000 anos, os maiores erros, atrocidades, etc etc, isso já não é uma hipótese pois está documentado e aceite por todos.
Não sou ateu, agnóstico ou crente,
Historiador ou cientista tãopouco sei o que sou. Mas lá vou cumprindo os rituais (funerais, baptizados, cazamentos etc), eu e todos os outros. Essa é que é essa.
Está enraizado na nossa cultura de tal maneira que não dá para "fugir destas coisas"
Parabéns pelo blog.
Pena é que não tenha muitos argumentos para participar mais. "Ignorantia"

Anónimo disse...

Sempre que se discute religião há muitas questões que se levantam, e na maioria das vezes, chega-se ao fim sem uma resposta válida, porquê? Porque são inúmeros os pontos de vista com que se analisa a evolução história de uma religião e as suas influências, por outro lado deve-se ter em conta a sensibilidade dos que nela creem, pois estes não se preocupam com factos ou provas cientificas, mas apenas dão valor à "sua fé". Para aqueles que nunca a tiveram torna-se difícil analisar as várias questões que hoje em dia a Religião coloca, principalmente quando se verifica que na maioria dos conflitos até hoje existentes a religião foi uma causa ou esteve implicada nesses conflitos...

Anónimo disse...

Dizem-nos os Evangelhos que Nicodemo foi encontrar-se com Jesus de noite porque tinha medo de ser visto com ele durante o dia! Eu acho que Jesus histórico não é o problema mais sério dos historiadores! O Cristo de fé é! A sua divindade foi uma "criação" de S. Paulo. Este não era um Zé ninguém. Era um friseu distinto e inteligente. Os fariseus foram responsáveis pela morte de Jesus, mas foram os próprios fariseus, que defendiam a ressureição (ao contrário dos Saduceus) que tornaram possivel a ressureição de Jesus. Este não era um Zé ninguém! Foi um grande "manager" da igreja incipiente. Não é sem razão que as suas "epístolas" são lidas durante as missas durante o ano todo!

Anónimo disse...

Também eu li o livro polémico "O Código da Vinci".Achei bastante interessantes as questões levantadas pelo autor mas, tal como não sei se Deus existe ou não, também não sei se tais questões têm ou não um fundo de verdade.No entanto não me surpreendeu a ideia de Jesus Cristo ser casado com Maria Madalena e esta afinal de contas não ser uma prostituta e sim uma mulher de familia nobre.Na Bíblia não há nenhuma referência a essa relação entre ambos,mas também não é dito que Jesus praticava o celibato.Não seria de estranhar também que a própria Igreja católica tenha manipulado as Escrituras de acordo com aquilo que lhe convinha.Ao longo da História a Igreja sempre foi conhecida pela sua forma de evangelização, através de jogos manipuladores e de interesses.A Igreja nunca quis senão servir os seus próprios interesses.Mas apesar disso continua a ter os seus fiéis seguidores.O que eu acho estranho é a forma como a Igreja reagiu à obra de ficção de Dan Brown.Se a Igreja estivesse segura daquilo que defende desde à séculos atrás e segura também de manter os seus seguidores penso que não daria tanta importância ao caso,nem mostraria tamanha inquietação e revolta.Será que a Igreja tem algo a esconder? Terá Dan Brown tocado na ferida?E agora levantando outra questão...será que ainda nenhum seguidor da religião católica se deu conta de uma(entre muitas) incoerência dessa mesma religião? Basta ler a Bíblia com atenção e dar-se-ão conta do seguinte:Deus condena a adoração de imagens.Está escrito na Bíblia...mas a Igreja Católica pratica exactamente o contrário, adorando uma infinidade de Santos e Santas em madeira,ouro,pedra,papel...quando Deus(se é que ele realmente existe)exigiu a exclusividade.Será que estou enganada ou temos aqui uma prova de que a Igreja só pratica e só dá a conhecer aos outros aquilo que lhes convém?

Anónimo disse...

Realmente não percebo a excitação à volta do Código Da Vinci. Aquilo é apenas uma obra de ficção, que se lê com sofreguidão até ao fim (já alguém referiu que parece um filme de acção), mas de valor histórico ZERO. Eu também podia afirmar que consultei os arquivos secretos do Vaticano sem nunca lá ter posto os pés; aliás, se os arquivos são secretos como é que o autor os consultou? Ah, já me esquecia, ele não pode divulgar o processo sob risco de represálias… Que conveniente, não é?
Sobre este assunto, sugiro a leitura de A Verdadeira História de Jesus de E. P. Sanders (The Historical Jesus, no original), salvo erro editado pela Presença e unanimemente considerado pela crítica como um excelente trabalho de investigação histórica.
O autor escalpeliza os Evangelhos, abstraindo-se do seu conteúdo teológico e tratando-os como qualquer outra fonte histórica. Junta depois os registos da administração romana que chegaram até nós, a par com alguns autores coevos, usando-os para reconstituir o contexto em que Jesus viveu. As conclusões, longe de espalhafatosas como as de Dan Brown, são sérias e apoiadas em documentação sólida (que refere em bibliografa): Jesus Cristo foi um judeu devoto, possivelmente casado pois era assim o costume na época, que teve uma família que a princípio via com preocupação o seu comportamento desviante da norma estabelecida e que contestou o judaísmo da época, sem nunca entrar em ruptura com ele.
Embora pouco se saiba sobre o pensamento de Jesus, sabe-se muito sobre a sua actividade.
Quanto ao Priorado de Sião, sugiro uma visita ao site http://bmotta.planetaclix.pt/ onde um Engenheiro Electrotécnico português desmonta por completo esta farsa (ao mesmo tempo passando um atestado de ingenuidade a quem acredita piamente em tudo o que escreve Dan Brown), provando que o dito Priorado remonta à década de 50… do séc. XX.
E, a propósito, existe consenso entre os investigadores que Maria Madalena teria a provecta idade de 92 anos ao tempo de Jesus…