“Goa tem sofrido diversas formas de jogos, principalmente pelo “jogo” comercial e torna-se uma “mina” pelas suas belezas naturais. (...) Até Boliwood lá assentou arraiais. (...) Goa é Natureza, Terra, Espírito e Povo. (...) Goa não é um Bloco Monolítico. (...) Não há Goa, há “Goas” para cada um de nós. (...)
“The Other”
Versão inglesa legendada em português
O filme começa com uma visão de quem chega de fora de Goa, uma visão muito próxima do/s objecto/s através da fotografia. E lá vai uma menina tentando fixar pormenores com a sua máquina na mão.
Afastando um pouco a objectiva repara-se na variedade Religiosa e focam-se três símbolos de três religiões diferentes, a Hindu, a Muçulmana e a Cristã, incluindo a Suástica e o OM.
É vista a forma como os próprios Goeses se vêem, como analisam a sua cultura e como se identificam, através da presença portuguesa, mas acima de tudo através da sua Língua e posição como Estado dentro da Índia.
Verifica-se a fertilidade das terras de Goa, tanto pelos seus solos como pela riqueza dos rios.
Os rios foram e são de grande utilidade, como meios de comunicação e regista-se o fantástico porto marítimo.
...“O isolamento político provocou o isolamento geográfico.” [Maria Aurora Couto]
Sossegad – uma expressão usada para definir Goa e os Goeses. São vistos como “ Italianos da Índia”, ou os “ Latinos da Índia”, esta por Rajan Narayan, ou talvez preguiçosos (?) com “maneira antiga de viver”, uma reflexão de Gerson da Cunha.
Refere-se o Turismo, e dele fala-se que começa por acidente, talvez com a Guerra do Vietname ou o fim dela, a vinda dos chamados Hippies na década de sessenta, que por ali passaram e foram transmitindo o quão agradável era a região.
Patrícia Pinto do “Save Goa Movement” refere-se a Goa como um sítio de prazer, Goa como um lugar alternativo.
Coloca-se o zoom da máquina a postos e passamos a objectiva pela Natureza, pela Velha Goa, pela Nova Goa e pelo Povo.
E chegando ao povo a Professora Celina Almeida exprime-se assim: ...” é difícil definir, hoje (ano de) 2007 o que é o Goês.”
Deambulamos junto de várias personalidades, apontamos o nosso instrumento fotográfico e carregamos no botão, disparamos em varias direcções e ficamos com a ideia de que quase se trata aqui de um jogo de adivinhas:
“O que é ser Goês?”
O Goês, no geral, não se consegue definir. Tem ainda atado ao seu pescoço uma cruz que mais parece uma âncora que o puxa para o fundo e para o fundo da mesma questão, mas quando vem á tona, grita que é Goês! Alguns definem, mas não concordam! Estas âncoras dão-lhes o “músculo” e põem-no a funcionar, dialogam, discutem e são cada vez mais fortes. Estão agora assustados, o governo aceita a entrada de qualquer Indiano migrante para Goa e mais, ao fim de quinze anos de permanência concede a identidade Goesa a esses “estranhos”. Os Goeses “verdadeiros” estão a sair de Goa, emigram, procuram outras paragens e há falta de mão-de-obra que atrai os migrantes de outras regiões da Índia para Goa. A região cresce e o aumento habitacional é intenso. A vinda destes migrantes levanta outra questão, haverá uma redefinição de identidade?
Foca-se também questões passadas, mais próximas de nós, pois nunca se anda neste filme perto do tempo de Albuquerque, uma dessas questões remete para a vontade que os estados vizinhos tinham, em assimilar Goa, mas Goa é firme e afinal tem identidade, tem um dialecto/língua (esta questão não fica definida no filme) próprio/a, o Konkani.
Volta-se atrás e Pundalik Naik refere um dos cultos anteriores á chegada do portugueses, estes faziam referência a uma deusa Hindu a quem cantavam certa música. Ele canta-a. Que pena a nossa maquina fotográfica não apanhar estas notas sonoras, e de seguida volta a cantar, mas... algo mudou, foi o nome da deusa, agora é Nossa Senhora de Fátima. E Pundalik afirma: “ Mudaram a religião, mas não mudaram a cultura.”
Faz-se também uma referência ao alfabeto utilizado para escrever a língua Konkani, e percebe-se que existe uma quase exigência para utilizar o alfabeto “romano”. (como é referido no filme)
A vontade dos estados vizinhos quererem absorver Goa passa também por um “braço-de-ferro” entre as línguas ou dialectos, principalmente entre o Marathi e o Konkani.
Depois ouvimos falar português (perfeito, diga-se) pela Sra. Maria Alice Shirsat e refere com muita graça: “Considero o português a minha Língua.” – Pede desculpas e ri-se. Foi um momento diferente.
Mas continua e acrescenta:.”cá fala-se mais a língua dos outros do que a nossa.” Muito Inglês e pouco Konkani.
Agora alguém sugere uma “guerra”, uma guerra aberta contra a globalização. O Goês não quer ser outra coisa e não quer assimilações, está farto, quer ser só Goês! Adianta alguém, “desejamos o fim da selvajaria que é a Globalização.”
O nosso instrumento tecnológico avançadíssimo, mostra agora com um registo em macro, dois pormenores muito concretos: a taxa de literacia em Goa é agora quase 100%, têm cinco canais de televisão local. Estamos perante um enorme desenvolvimento do que se revela ser o “nosso” (Ocidental) modo de ver o mundo.
Agora a politica, não podia faltar. O maior argumento politico usado pelos goeses perante a Índia, é de facto a sua identidade. Respondendo um pouco àquela adivinha, a identidade Goesa passa pelas paisagens de Goa e acima de tudo pela Língua! Conseguiram, são independentes, são um Estado!
O autor do filme revela no fim uma espécie de conclusão que diz o seguinte:
“ E o Goês como se identifica? Aproveita as ideias dos outros, mas nega-as com frequência, assim deixa sempre um vazio de definição...”
Voltámos ao mesmo? Não acredito, penso, que falta ali qualquer coisa... Mas quem sou eu para pensar?
Debate sobre a identidade goesa
O Professor Narana Coissoró:
“ A identidade Goesa não sofre de um problema isolado. Outros grupos de povos também se querem afirmar nesta senda. (e referiu vários povos dentro da própria Índia [não tive tempo para assentar nos apontamentos]) (...) Konkani é a pedra angular da reconstrução de Goa e define também a sua politica (...) o medo da migração existe pelo medo da perda da língua (...) e há sempre uma pergunta que fica, sou ocidental ou Indiano, mas olha-se pra ela sempre pela negativa (...) é do interesse do governo Goês manter Goa independente (...) pode gastar o dinheiro, usar a sua própria economia e ordenar o território da forma que entender, isto é poder (...) há uma forma que só Goa teve para ser independente e foi a forma imaterial, através da língua (...) Konkani como base de independência financeira (...) antes (o Konkani) tinha muitas palavras portuguesas, agora chega a ter frases inteiras em inglês (...) é uma língua que se molda á forma utilizada (...) o desenvolvimento de Goa é provocado pela sua independência (...) “.
Dr. Jason Fernandes (Investigador- Estudante no ISCTE, Lisboa, falou em Inglês [tradução minha]
“A maior parte dos filmes feitos sobre Goa dão uma má imagem, este filme é feito pela positiva, parabéns ao realizador!”
“...os Goeses ainda estão entre a indecisão de serem portugueses ou indianos... mas o facto é que o 25 de Novembro aconteceu, aprendam a viver com ele, ultrapassem-no!!! “
“...penso que ideia de ter uma só identidade é retrógrada (old fashion) ...”
“...qual o Konkani que Goa quer ter? É um debate muito forte agora em Goa.”
E por fim o Dr. Sérgio Mascarenhas (viveu 7anos em Goa como Delegado da Fundação Oriente):
Colocou em paralelo os Filipes de Portugal e Espanha e referiu-se a uma estátua de Filipe II que esteve algures mas foi retirada. Os portugueses ao retirarem a dita estátua negam a presença espanhola em Portugal, os Goeses parecem querer fazer o mesmo em relação a Portugal. Têm tendência para se afastar dessa realidade. Portugal esteve lá, mas já não está!
Refere também uma ideia interessante, de que se o debate sobre a identidade de Goa parasse, Goa desapareceria!
Fala de Goa como uma válvula de escape para as elites Indianas. Sugere Goa como um espaço de liberdade total e ocidentalizado. Estas elites, na sua maioria, frequentaram escolas no Ocidente e aí, em Goa, encontram um local como não há no resto da Índia.
E em conclusão refere que há imensos mal entendidos entre Goeses e Portugueses! Estes mal entendidos acabariam se se levasse mais Portugueses a Goa e se se trouxesse mais Goeses a Portugal!
Para concluir:
Retratei o que observei e ouvi no filme e dos oradores. Tomei alguma liberdade na expressão. Peço que me dêem algum “desconto” em erros que tenha cometido quanto aos nomes e palavras locais que refiro neste trabalho.
Marco Marçal